O MPLA (partido que governa Angola desde 1975) diz que a sua aposta é no “socialismo democrático”. A tradução significa, como em todo o mundo, tirar aos pobres para dar aos ricos. Essa foi, aliás, condição sine qua non para o país entrar para o Conselho de Segurança da ONU.
Por Orlando Castro
O vice-presidente do MPLA, Roberto Victor de Almeida, explica que “o socialismo democrático defende a justiça social, o humanismo, a liberdade, a igualdade e a solidariedade”. Apenas se esqueceu de acrescentar: “olhai para o que dizemos e não para o que fazemos”.
Em 2011, numa sessão de reeducação do povo, realizada no Centro de Conferências de Belas, em Luanda, disse que o socialismo democrático “tem como fundamento a garantia da harmonia entre o desenvolvimento individual e o colectivo, a preservação dos valores nacionais e a defesa dos direitos, liberdades e interesses de todos os cidadãos”, e “visa obter a igualdade de direitos para as raças, grupos étnicos, tribos, nações e confissões”.
Ou seja, visa obter tudo aquilo que é negado pelo mesmo MPLA ao povo angolano. Aliás, em Angola todos são livres de pensar… como pensa o regime, todos são iguais desde que aceitem as regras de quem está no poder e que, cada vez mais, se assume não só como dono do país como, igualmente, proprietário dos escravos que devem obediência cega, canina e divina ao líder supremo, no caso José Eduardo dos Santos.
Roberto de Almeida falou então da necessidade de se consolidar os ideais do partido, resgatando muitos dos valores morais e éticos perdidos, sublinhando que a perda valores não elimina apenas a solidariedade, como também deforma o futuro da pessoa humana.
Nesta tentativa de vender gato por onça, o MPLA esquece-se que só se pode perder o que se tem ou se teve. Ora os valores referidos nunca foram uma característica de um partido cuja única divisa é: quero, posso e mando.
Numa outra dissertação sobre “socialismo democrático e a acção económica e social”, o secretário do Bureau Político para a Esfera Económica, Manuel Nunes Júnior, declarou que o socialismo democrático é a via para o alcance da verdadeira independência económica de Angola e a elevação do bem-estar e da qualidade de vida do povo angolano, de Cabinda ao Cunene.
Com cada vez mais angolanos de barriga vazia, falar do bem-estar e da qualidade de vida do povo angolano, ou do povo amordaçado de Cabinda, é não só gozar com a chipala de quem é gerado com fome, de quem nasce com fome e de quem morre pouco depois com… fome, como aviltar a inteligência dos que sabem que o regime angolano é, mesmo sendo benevolente, autocrático.
“Alcançado o programa mínimo com a proclamação, a 11 de Novembro de 1975, da independência nacional, a grande tarefa é a satisfação dos anseios do povo angolano, quanto ao bem-estar e a qualidade de vida, mediante um sistema em que o Estado assume o papel de agente regulador e coordenador de toda actividade económica e social”, declarou Manuel Nunes Júnior, recitando a teoria política da sua família, a Internacional Socialista.
Se dúvidas existissem sobre o socialismo democrático do MPLA, basta ver – por exemplo – o perfil do cliente angolano em Portugal, que representa mias de 30% do mercado de luxo português. Trata-se sobretudo de homens, 40 anos, empresários do ramo da construção, ex-militares ou com ligações ao governo. Vestem Hugo Boss ou Ermenegildo Zegna. Compram relógios de ouro Patek Phillipe e Rolex.
Basta ver – por exemplo – o perfil do povo angolano, que representa 70% da população, é pé descalço, barriga vazia, vive nos musseques, é gerado com fome, nasce com fome e morre pouco depois com… fome.
Basta ver – por exemplo – que esses angolanos de primeira (todos adeptos certamente do socialismo democrático) não olham a preços, procuram qualidade e peças com o logo visível, sendo comum uma loja de luxo facturar, numa só venda, entre 100 e 200 mil euros, pagos por transferência bancária ou cartão de crédito.
Por outro lado, de acordo com a vida real dos angolanos (de segunda), 45% das crianças sofrem de má nutrição crónica e uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos.
É assim o socialismo democrático de que fala o regime. É esse mesmo que limita a um número muito restrito de famílias ligadas ao poder o acesso à boa educação, aos condomínios, ao capital accionista dos bancos e das seguradoras, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolíferos.
É assim o socialismo democrático que entre milhões que nada têm, permite a vilanagem daqueles que vestem Hugo Boss ou Ermenegildo Zegna, compram relógios de ouro Patek Phillipe e Rolex, ou que dão 120 mil euros por uma pulseira.
É assim o socialismo democrático que permite que a casta superior e divina que dirige o país desde 1975 tenha ementas do tipo: Trufas pretas, caranguejos gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e uma selecção de queijos acompanhados de mel e amêndoas caramelizadas, com cinco vinhos diferentes, entre os quais um Château-Grillet 2005.